segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Artigo da Vanity Fair


Artigo da edição da Vanity Fair de Novembro, que pode ser lido na língua original aqui. Texto de Paul Theroux. Fotografia de Gasper Tringale. Traduzido pela equipa do MURAKAMI PT do inglês.


Um romance japonês de 932 páginas, passado em Tóquio, no qual as palavras «sushi» e «sake» nunca chegam a aparecer, mas recheado de referências a vinho francês, assim como a Proust, a Fay Dunaway, ao livro The Golden Bough, a Duke Ellington, a Macbeth, a Churchill, a Janácek, a Sonny e Cher, e, a partir do sugestivo título, a George Orwell? Bem-vindos ao mundo 1Q84 de Haruki Murakami, à primeira-vista um autêntico calhamaço, mas que acaba por se provar uma leitura agradável, seguindo uma linha simétrica e multifacetada, mais ou menos como um edifício de três andares do século XIX até onde é possível fazer a comparação (no Japão, entre 2009 e 2010, foi lançado em três volumes, todos eles com grande sucesso). Tendo-lhe sido colada a etiqueta de realismo-mágico, na verdade apresenta uma estrutura mais próxima da Dickensiana (Charles Dickens) ou Trollopiana (Anthony Trollope). Por coincidência, tal como Trollope, Murakami costuma levantar-se às quatro e meia da manhã, escrevendo até por volta do meio-dia – e depois disso, agora ao contrário de Trollope, treina os seus triatlos.

“Uma história de amor” não faz justiça ao padrão propulsivo deste enredo, às mortes e desaparecimentos nos mundos paralelos de duas personagens, Aomame («Ervilha») e Tengo. Estes dois não se encontram há vinte anos, mas cada um deles está presente na memória um do outro. Aomame tem feições suaves, é forte, indiferente aos homens parecidos com Sean Connery, e assim que um deles decide aquecer a sua vida ela revela-se como uma dedicada assassina. Tengo é um escritor tímido, envolvido na revisão de um romance escrito por uma rapariguinha. Estamos no ano de 1984, ou será antes um lapso temporal, 1Q84? 

Explícito, ainda que subtil e onírico, combinando agressividade com um certo capricho, e mais erótico do que o habitual em Murakami, esta é a tentativa mais incansável e magistral do autor no desejo e na busca pelo Todo.

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